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25 de Abril de 2024

Caixa de drogaria vítima de 20 assaltos consegue rescisão indireta e indenização

Depois de sofrer cerca de 20 assaltos na drogaria em que trabalhava como caixa, uma empregada buscou na Justiça do Trabalho a decretação da rescisão indireta do seu contrato, além de indenização por danos morais. Ela alegou que sua empregadora mantinha postura de descaso diante dos inúmeros assaltos a que foi exposta, sem demonstrar qualquer preocupação com o estado físico ou emocional dos empregados, ignorando por completo suas tentativas de troca de posto de trabalho.

A drogaria se defendeu alegando ser impossível a sua responsabilização, já que a garantia da segurança pública é dever do Estado. Mas esse argumento não convenceu a juíza Sílvia Maria Mata Machado Baccarini, que julgou o caso na 16ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte. Para a magistrada, o direito à segurança, invocado pela empregada, deve ser analisado sob uma perspectiva diferente. Isso porque, nesse caso, a discussão não gira em torno do dever do Estado de zelar pela lei e ordem, mas sim sobre o dever do empregador de garantir a seu empregado, ante a dura realidade de violência que aflige a sociedade, condições mínimas para prosseguir no emprego, não só com integridade física, mas também psicológica.

A magistrada constatou que os empregados da drogaria viviam em constante pressão mental e insegurança, pois, como demonstrado pela prova testemunhal, a trabalhadora foi vítima da inacreditável cifra de 20 assaltos, enquanto sua colega viveu esse horror por 12 vezes em 05 meses.

Apesar disso, a empregadora se limitou a instalar câmeras de vigilância, o que, na ótica da juíza, trata-se de medida de segurança mínima, de pouco ou nenhum impacto contra criminalidade. O mais grave, porém, segundo ponderou a magistrada, foi que a empregadora adotou medidas de minimização de suas perdas, determinando a realização de constantes sangrias, de forma a não deixar dinheiro acumulado nos caixas, sempre que atingido o limite de R$400,00. Ou seja, quando essa quantia era alcançada, o sistema de informática emitia um alerta para a realização da sangria, a ser executada pelo gerente, que, contudo, nem sempre atendia prontamente à requisição, fazendo com que houvesse acúmulo de valores superiores ao determinado pela empregadora. Sabedora dessa situação, a drogaria adotou o que a juíza considerou a mais absurda das atitudes: estabeleceu que os valores porventura subtraídos pelos assaltantes que viessem a superar o limite de R$400,00 deveriam ser restituídos pelos empregados, conforme explicado pela testemunha.

"Irrelevante a alegação da reclamada de que orientava seus empregados a não reagirem aos assaltos, já que, contraditoriamente a tal medida de cunho apenas retórico, esta procedia aos descontos dos prejuízos que ultrapassassem R$400,00, acabando por levar o empregado a cogitar medidas meramente paliativas, como esconder o dinheiro ou qualquer outra manobra que lhe pudesse proteger, ainda que de maneira precária, de eventual prejuízo financeiro. E tudo sob o risco de o assaltante descobrir o engodo e se enfurecer ainda mais, descontando sua raiva em quem menos a mereceria. Pois é. A situação ora em exame era exatamente aquela descrita em consagrado dito popular, o qual transcrevo, com a devida vênia: se correr o bicho pega; se ficar o bicho come. Não existe meio termo. É perder ou perder, ou seja, perder a vida instantaneamente ou perder, pouco a pouco, o fruto de seu trabalho destinado a seu sustento e à manutenção digna de sua existência", ponderou a magistrada.

Ela registrou ainda na sentença que a empregadora tentou impor aos seus empregados o que denominou de processo de cauterização do sofrimento, no qual o empregado ia ficando calejado e acostumado com esta vida travada em verdadeiro campo de batalha, por meio de absurda atribuição compartilhada pelo risco do empreendimento. "De tão à vontade em sua postura, passou a reclamada a se comportar como se o estado atual de criminalidade, por ser tão inafastável e de responsabilidade apenas estatal, pudesse ter suas consequências compartilhadas por todos, numa grande corrente de vítimas que se apoiam e partilham entre si a insegurança, a mágoa e os prejuízos, enquanto apenas ela própria, a empresa empregadora, usufrui sozinha dos lucros auferidos", pontuou.

Ressaltando que a situação vivenciada pela empregada levou-a um estado de fragilidade emocional, com acentuado quadro de depressão, choro fácil, insônia e irritabilidade, a magistrada concluiu ponderando que o fato de a empregadora não ter o dever de oferecer segurança pública a seus empregados não lhe dá o direito de expô-los ainda mais a riscos e a situações de medo e angústia, forçando-os, ainda que de maneira indireta, a escolher, por vezes, entre a intangibilidade de seu salário e a própria vida.

Assim, diante da falta de garantia da incolumidade física e mental da trabalhadora, além de outras faltas constatadas (acúmulo indevido de funções e não pagamento do tempo à disposição), a magistrada deferiu a rescisão indireta, bem como indenização por danos morais arbitrados em R$13.000,00.

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Prezados

Certamente a Caixa merece todo o nosso apoio e consideração, pois é um absurdo passar por 20 assaltos sem que as autoridades policiais se dignem a, pelo menos, ler os Boletins de Ocorrência que redigem. Pois se o fizessem se surpreenderiam com a recorrência e (talvez) tomassem alguma providência.
A desconsideração da alegação de defesa da empresa me faz pensar, onde fica
o Artigo 144 da Constituição de 1988 (parece que vigente...)? Artigo este que reproduzo com alguns (nem todos) incisos abaixo:

Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:

I - polícia federal;
II - polícia rodoviária federal; III - polícia ferroviária federal; IV - polícias civis; V - polícias militares e corpos de bombeiros militares. continuar lendo

(...) direito e responsabilidade de todos (...)
Caro Dr., penso que a decisão é oportuna, pois, poderá a empresa condenada ajuizar ação de regresso contra o Estado, e, nesse diapasão, todas as empresas que passam pelo mesmo problema. continuar lendo

A continuar neste sentido as decisões da Justiça do Trabalho, não mais teremos empresas, pois estas são tidas como responsáveis por tudo, agora até pela segurança pública. Neste ritmo será impossível manter um pequeno negócio. continuar lendo