Busca sem resultado
jusbrasil.com.br
26 de Abril de 2024

Alto padrão remuneratório e poder de gestão afastam direito de gerente de vendas a horas extras

Empregados que desempenham funções incompatíveis com a fixação e fiscalização do horário de trabalho ficam excluídos do regime de duração de jornada. Em consequência, não terão direito ao recebimento de horas extras. A exceção também se aplica àqueles que ocupam cargos de confiança, com padrão salarial diferenciado. É o que está expresso no artigo 62 da CLT.

Essa questão veio à tona em julgado recente da 9ª Turma do TRT de Minas, no qual o gerente de vendas de uma concessionária de veículos pleiteou o recebimento de horas extras. E obteve sucesso em 1º grau, já que o juiz, conjugando as contradições na defesa com o fato de o estatuto social da ré prever que apenas o presidente e o vice-presidente detinham capacidade de gestão efetiva dos negócios, afastou a excludente do artigo 62, II, da CLT e condenou a empregadora ao pagamento de horas extras. Protestando contra a condenação, a concessionária invocou novamente, em seu favor, essa norma de exceção, afirmando que o ex-empregado ocupava cargo de confiança, com poder de mando e gestão, com salário mais elevado que os demais trabalhadores a ele subordinados.

Ao relatar o recurso da empresa, a desembargadora Mônica Sette Lopes explicou que há uma confusão na compreensão do sentido do art. 62, II, da CLT: as pessoas que se enquadram neste padrão de exceção do regime geral de limitação de jornada normalmente dedicam à empresa muito mais tempo que o empregado ordinário. Segundo ponderou, a importância desse profissional para a gestão das diversas áreas da empresa é tanta, que eles podem ser acessados a qualquer hora, mesmo quando não estejam no estabelecimento e, lá estando, é comum que sejam os primeiros a chegar e os últimos a sair. Portanto, o fato de não assinarem ponto é irrelevante porque há uma demanda do tempo deles que pode ser percebida na própria atividade. E nem é preciso que eles decidam sobre todas as questões. Como exemplo, citou que admitir e demitir empregados é uma tarefa como qualquer outra, executada segundo parâmetros técnicos, e, por isso, ela não define, por si só, a natureza do cargo. Também não se exige que esses empregados de confiança estejam no ponto mais alto da estrutura hierárquica: eles podem, simplesmente, exercer atividades de gestão. A característica fundamental para que se configure o gestor de confiança é que este seja remunerado de forma substancialmente alta em relação à empresa e também em relação aos padrões de mercado.

E, no caso, a desembargadora constatou que o empregado, de fato, exercia um cargo de confiança, já que alegou ter sido admitido na função de gerente de vendas, tendo uma equipe de vendedores sob o seu comando. A média remuneratória declarada foi de R$5.200,00. A conclusão da julgadora foi de que ele se enquadrava na exceção do artigo 62, II, da CLT, em razão do seu padrão remuneratório diferenciado. Ela esclareceu que o fato de os vendedores receberem comissões em valores superiores ao gerente é razoável em determinada época do ano, levando em consideração o ramo de negócios da empresa. Mas essa circunstância não impede que se reconheça que o empregado ocupava um ponto destacado da estrutura hierárquica da ré, estando subordinado apenas ao Diretor Comercial, um dos seus sócios. Ressaltou a relatora que o teor do estatuto social da empresa não exclui o poder desse Diretor quanto à capacidade de gerir a pasta de vendas, sendo a natureza de suas atividades diversa dos diretores estatutários.

De acordo com a relatora, o que conta, no caso, é que o regime jurídico do empregado tem sua regulação peculiar, que inclui o tratamento da limitação de jornada:"Ainda que a testemunha ouvida informe os horários de trabalho do reclamante, não há discrepância nisso. Qualquer trabalhador, de que nível for, tem o seu horário habitual de presença no estabelecimento da empresa. Como se afirmou, para o art. 62, II da CLT, não se impõe como pressuposto a ausência de controle de jornada, até porque é normal que os chefes mais bem remunerados permaneçam parte significativa do dia na empresa. Poder-se-ia até admitir que esse tempo de permanência do exercente de cargo em confiança fosse registrado. Se ele receber valor de salário acima do padrão, a ele se aplica o art. 62, II da CLT. Se isso não ocorrer, pouco importa o fato de não registrar jornada", esclareceu, registrando que o patamar salarial do gerente de vendas, cujo pagamento de salário não contabilizado foi reconhecido em juízo, fixa sua situação jurídica na faixa de exclusão do regime geral de limitação de jornada.

"Há uma consonância interpretativa que conjuga esses dois pontos. O resultado seria outro se não se fixasse a extensão remuneratória que decorre da prova. O autor tinha posição diferenciada compatível com o previsto no art. 62, II da CLT", finalizou a desembargadora, dando provimento ao recurso da empresa para excluir da condenação as horas extras. O entendimento foi acompanhado pelos demais julgadores da Turma.

  • Publicações8632
  • Seguidores631525
Detalhes da publicação
  • Tipo do documentoNotícia
  • Visualizações727
De onde vêm as informações do Jusbrasil?
Este conteúdo foi produzido e/ou disponibilizado por pessoas da Comunidade, que são responsáveis pelas respectivas opiniões. O Jusbrasil realiza a moderação do conteúdo de nossa Comunidade. Mesmo assim, caso entenda que o conteúdo deste artigo viole as Regras de Publicação, clique na opção "reportar" que o nosso time irá avaliar o relato e tomar as medidas cabíveis, se necessário. Conheça nossos Termos de uso e Regras de Publicação.
Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/noticias/alto-padrao-remuneratorio-e-poder-de-gestao-afastam-direito-de-gerente-de-vendas-a-horas-extras/113986316

4 Comentários

Faça um comentário construtivo para esse documento.

Não use muitas letras maiúsculas, isso denota "GRITAR" ;)

O artigo 62 da CLT é uma afronta a dignidade dos trabalhadores que exercem cargo de confiança.
É um salvo conduto aos empresários para aplicarem de forma descarada a mais valia, a exploração que leva muitas vezes o trabalhador a ser cometido de lesões físicas e mentais pelo excesso de horas trabalhadas e, por abrir mão de seu descanso e lazer.
Tal artigo, embora exista entendimento jurisprudencial de que é constitucional, pois a CF/88, o recepcionou, não há de ser considerado pétreo, devendo nossos legisladores e doutrinadores, buscarem no âmbito legislativo a sua alteração, para que tenha um ordenamento que atenda os ditames de nossa Carta Constitucional em especial quando se refere a dignidade da pessoa humana e o art. 7º inciso XIII, que declara ser assegurado ao trabalhador duração de trabalho normal não superior a oito horas diárias.
Dessa forma, nossos tribunais poderiam reconhecer as horas exploradas pelo patrão, em favor destes trabalhadores. continuar lendo

E tem mais Marcos, a Desembargadora ainda citou em seu voto que poder-se-ia controlar às horas de quem exerce cargo de confiança. Ora, se é cargo de confiança não há que se falar em controle interjornada, pois a CLT é clara ao afirmar que não poderá haver controle da jornada de trabalho. Ademais,temos vários julgados confirmando isso. continuar lendo

No caso de trabalhador exercente de cargo de confiança, confunde-se, na mesma pessoa, a figura de empregado e empregador, pois a posição de mando acompanha o obreiro que atua em cargo superior aos demais na corporação. Portanto, a carga horária deste deve ser livre, sem controle e, logo, sem direito as horas extraordinárias eventualmente surgidas, pois o salário maior a que faz jus, em tese, supriria tal lacuna. continuar lendo

Qual o n. do RO? Gostaria de ter acesso à íntegra deste Acórdão. Obrigado. continuar lendo