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16 de Abril de 2024

Empresa terá que indenizar família de motorista de caminhão que morreu em acidente


O motorista de caminhão está sujeito a um grande risco de se acidentar no exercício da profissão, pois, diariamente, enfrenta o perigoso e complicado trânsito nas rodovias brasileiras, além do estado precário das nossas pistas, podendo perder sua vida por um simples descuido. Atentos a essa situação, os magistrados trabalhistas têm aplicado, nesses casos, a teoria do risco profissional, que leva à responsabilização objetiva do empregador (artigo 927, parágrafo único, do Código Civil). É que essa atividade, por sua própria natureza, expõe o trabalhador ao perigo, tornando o empregador responsável por reparar os prejuízos decorrentes do acidente de trabalho, independentemente da comprovação de culpa.

Foi justamente esse o fundamento adotado pela 2ª Turma do TRT/MG, ao julgar favoravelmente o recurso apresentado pelos filhos de um motorista de caminhão que morreu num acidente enquanto trabalhava. Acompanhando o voto do relator, desembargador Sebastião Geraldo de Oliveira, a Turma entendeu que a atividade profissional desempenhada pelo trabalhador o colocava em situação de risco acentuado. Por isso, reconheceu a responsabilidade objetiva do empregador que, assim, deve reparar os prejuízos decorrentes do acidente, independentemente da comprovação de culpa. A sentença foi modificada para garantir aos herdeiros o direito ao recebimento de indenizações por danos morais e materiais.

No caso, o trabalhador estava dirigindo em uma rodovia estadual, transportando cargas para a sua empregadora, uma empresa de comércio de bebidas, quando sofreu o acidente de trabalho fatal. Ele cochilou ao volante e o caminhão que conduzia atravessou a contramão, quebrou a mureta de proteção de uma ponte e caiu próximo ao leito de um córrego. O juiz de Primeiro Grau indeferiu o pedido de indenização por danos morais e materiais, por entender que a empresa não contribuiu direta ou indiretamente para o acidente. Mas o relator deu ao caso uma solução diferente.

Inicialmente, o desembargador afastou as afirmações dos filhos do trabalhador de que ele cumpria jornada exaustiva e estava prestando horas extras no momento do acidente. Isso porque o acidente ocorreu às 03h15 e a jornada contratual do trabalhador, prevista para o horário noturno, era de 22h às 05h. Entretanto, o julgador chamou a atenção para o fato de que a função de motorista de carga, desempenhada pelo falecido, o deixava exposto a um perigo maior de sofrer acidentes automobilísticos. É, portanto, uma atividade de risco acentuado, pois esses profissionais enfrentam diariamente condições adversas ao lidar com o arriscado e complicado trânsito nas rodovias brasileiras, em precário estado de conversação. Sendo assim, para o julgador, deve incidir aí a teoria do risco da atividade, com a responsabilidade objetiva da empresa, ou seja, ela está obrigada a reparar os danos decorrentes do acidente de trabalho que matou o trabalhador, independentemente da sua culpa no acontecimento.

Conforme explicou o relator, nos termos do parágrafo único do art. 927 do Código Civil, não depende de culpa a obrigação de reparar o dano quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano (no caso, a empresa) gerar, por sua própria natureza, riscos para os direitos do empregado, ou seja, quando se criam condições inseguras para o trabalhador, como no caso. Nesse quadro, a responsabilidade da empresa pelos danos decorrentes do acidente decorre, pura e simplesmente, do exercício da atividade de risco (sendo que "atividade" indica a prestação de serviço conduzida pelo empregador), tendo ela contribuído ou não, com qualquer ação ou omissão, para a ocorrência do acidente.

"Quando o empregador decide explorar uma atividade econômica, ele assume os riscos (art. da CLT). O empregado prejudicado em razão da prestação dos serviços não pode ficar desamparado. As disposições legais que, em inúmeras hipóteses, determinam a incidência da responsabilidade de natureza objetiva, visam a realizar a solidariedade social, por meio da ampla proteção aos lesados. Embora os danos (injustos) sejam causados por atos lícitos, o legislador quis fossem indenizados, ampliando intencionalmente a proteção em favor da vítima", destacou o relator.

Ele ressaltou, ainda, que a responsabilidade objetiva prevista no parágrafo único do artigo 927 do Código Civil tem sido repetidamente aplicada nas ações envolvendo acidentes do trabalho. O entendimento é de que o dispositivo não se opõe ao artigo , XXVIII, da Constituição da República, que prevê como direito dos trabalhadores a indenização por acidente de trabalho, a cargo do empregador, mas quando ele incorrer em dolo ou culpa. É que o caput da regra constitucional garante "a inclusão de outros direitos que visem à melhoria da condição social dos trabalhadores", além daqueles estabelecidos nos seus incisos, e interpretação da norma deve levar em conta todo o seu conjunto.

Além disso, frisou o relator, grande parte da jurisprudência do TST é no sentido de enquadrar a categoria profissional do motorista de caminhão como atividade de risco. Para reforçar sua posição, o relator, citou, ainda, o Enunciado 37, adotado na IV Jornada de Direito Civil promovida pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal, em outubro de 2006: "Responsabilidade civil objetiva no acidente do trabalho. Atividade de risco. Aplica-se o art. 927, parágrafo único, do Código Civil nos acidentes do trabalho". E, na mesma direção, o Enunciado 38 aprovado na 1ª Jornada de Direito Civil, promovida pela mesma entidade, em 2002: "Art. 927: A responsabilidade fundada no risco da atividade, como prevista na segunda parte do parágrafo único do art. 927 do novo Código Civil, configura-se quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano causar a pessoa determinada um ônus maior do que os demais membros da coletividade".

Condenação

Por essas razões, o desembargador reconheceu que a empresa está obrigada a indenizar os prejuízos causados aos reclamantes em decorrência da morte do pai deles. Mas, observou que o trabalhador também teve culpa no acidente, ao "dormir no volante". "Espera-se que todo motorista se prepare adequadamente para as viagens, evitando dirigir com"débitos de sono", pois a falta de sono afeta o tempo de reação do motorista e sua capacidade de concentração, o que, certamente, não era desconhecido pela vítima, na sua função de motorista de caminhão", frisou.

Dessa forma, em razão da culpa concorrente do falecido, o relator aplicou ao caso o artigo 945 do Código Civil, que não exclui a responsabilidade civil do empregador, mas determina a fixação de valor da indenização na proporção da culpa dos envolvidos, levando à distribuição proporcional dos prejuízos, arbitrada pelo relator, ao caso, como sendo de 50% (cinquenta por cento) para cada uma das partes. Considerando que os filhos do trabalhador falecido tiveram prejuízo ao serem privados da renda proporcionada pelo trabalho do pai, o desembargador reconheceu a eles o direito ao recebimento da indenização por danos materiais, na forma de pensionamento mensal, independentemente de a mãe deles já receber a pensão previdenciária por morte. Foi deferida também uma indenização por dano moral, no valor de R$15.000,00 para cada um dos filhos do trabalhador, atingidos que foram pela irreparável perda prematura do pai.




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Cuidado ao dar carona, você pode ser responsabilizado civilmente em caso de acidente

1 Comentário

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discordo da decisão, pois considerar a profissão como perigosa é desconsiderar normas regulamentadoras do próprio ministério do trabalho, entendo e concordo que o trânsito brasileiro é perigoso, porém de acordo com a NR 16 só está exposto em atividade perigosa quem atua em: Inflamáveis, explosivos ou energia elétrica ou em atividades profissionais de segurança pessoal ou patrimonial, em estudo está a de motofrete.
considerar a profissão motorista PERIGOSA abre uma jurisprudência que devemos analisar com cautela, poderia sim deferir indenização por outros motivos, como excesso de jornada ou falta de descanso intra jornada, fatos que se houver analise dos diários de bordo ou tacógrafos do motorista provavelmente iriam em desacordo com a lei 13.103/2015 continuar lendo